DESIGN - Espaço Negativo - O vazio

Quando estudamos arte, e no nosso caso a arte do Bonsai, temos de ter em atenção que devemos de analisar a árvore como um conjunto, e não uma soma das suas partes. Quero com isto dizer que é interessante aprender as regras sobre um bom Nebari, construir um tronco sólido, e até criar uma excelente ramificação. Mas quando falamos em estética temos de pensar em sentido global.

Por isso, vou continuar a falar de alguns conceitos estéticos, e optei pelo mais esquecido (porque não se vê na obra em si): O vazio, ou espaço negativo.

"A beleza reside onde não há nada"

Este proverbio japonês pode surpreender a nossa lógica, especialmente na mentalidade de um ocidental, que por norma parecemos ter medo ao vazio. Se repararmos, fazemos coleção de objetos em todas as divisões da nossa casa. Não podemos ver uma parede vazia que tencionamos colocar lá quadros, espelhos, etc, etc. Na nossa visão materialista sentimos algum desconforto pelo vazio.

Contudo, o vazio não nos é alheio. representa mais 99% do universo. E temos grandes exemplos de vazio nos nossos artistas:


Mostro aqui um exemplo de arte renascentista. Do artista Caravaggio: São Mateus e o anjo. Onde grande parte da obra é vazio, sombra e escuridão. Mas que esteticamente dá destaque às 2 personagens.

Mas vamos aprofundar conceitos teóricos: O espaço negativo é simplesmente a ausência de qualquer objecto no conjunto. É um espaço vazio. E isto inclui espaços dentro e fora do conjunto, mas que pode ter uma forte influência no balance artístico, especialmente no seu dinamismo. Ou seja, colocamos os espaço negativos da árvore de uma maneira que implique movimento, fazendo que os nossos olhos se desloquem de uma parte até outra. 

Em outras palavras, tudo o que ocupa espaço o denominamos "espaço positivo", e ao vazio "espaço negativo" E para existir um tem de existir o outro. E o balance entre os 2 resulta num equilíbrio ou numa tensão visual.

"Bonsai é adicionar vazio à árvore"

Em Bonsai, os espaços são sumamente relevantes, mesmo sem pensar no design. O vazio entre a ramificação tem muitos significados. Podemos ver como o ar e a luz entram entre as ramas para desenhar as linhas do tronco, para apreciar a sua textura. O espaçamento é saudável para o crescimento das ramas. O vazio permite a entrada do sol, eliminando pragas prejudiciais. A falta de espaço, pelo contrario, gera uma sensação de peso, aperto e sufoco. 

Uma árvore sem espaços representa mais um buxo de jardim do que um Bonsai.

"Um grande bonsai pode ter tanto de vazio como de espaço positivo"

Seguindo na estética, por norma, os nossos olhos fazem um movimento desde o ponto mais alto (ou mais denso) para o ponto mais baixo.  Obviamente existem sempre exceções. Mas por regra geral temos esta tendência. Vejamos aqui um exemplo:


Coloco aqui "A grande onda de Kanagawa" de Katsushika Hokusai. Temos aqui um claro exemplo de espaço negativo. Em certo modo, o vazio se encontra equilibrado com a massa do conjunto, numa espécie de Ying Yang. Mas temos noção que graças a esse vazio a onda obtém relevância na composição. 

Vejamos o seu equivalente no mundo de Bonsai. Retirei este exemplo da prestigiada exposição Kokufu. Um Junípero Chinês, vencedor do prémio de 2016. Reparem que, qual onda de Kanawaga, se abate sobre o seu espaço negativo do lado direito. E que propositadamente foi envasado no lado esquerdo para poder dar assim mais ênfase ao espaço negativo. Não é por acaso que estas árvores são vencedoras.



Para analisar o vazio, nada melhor que criar um desenho positivo/negativo. Onde podemos estudar a relação entre o que ocupa espaço. Vemos assim o peso visual de cada um dos espaços; qual tem mais preponderância; para onde se dirige o fluxo (Nagare) etc etc. Com estes exercícios podemos ter uma melhor percepção do conjunto:


Ora vejamos o desenho de cima. Com uma representação positivo/negativo conseguimos ver facilmente que a massa do conjunto (no espaço superior) supera o seu vazio (espaço inferior direito). Que o fluxo da árvore segue da esquerda para a direita, e que seguindo este ciclo podemos elaborar uma boa composição. E se reparamos no exemplo anterior vemos que seguem um mesmo padrão.

Espero que com estes exemplos vejam as vossas árvores de outra forma, e que vos facilite o trabalho na hora de escolher que ramas devemos manter e que ramas de vemos cortar. 

Vejam o vazio com outros olhos. Ele pode revelar-vos muitos pormenores.


 Que acham? Esta composição está bem conseguida? Sentem que existe algum equilíbrio entre a árvore e o seu respectivo espaço negativo?



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